Portugal endurece imigração. Espanha afrouxa. Quem está certo?
As políticas de imigração continuam a causar polémica. Portugal adota o caminho da restrição, enquanto a vizinha Espanha, abre suas portas aos imigrantes de forma seletiva e objetiva. Portugal se perde em discussões inócuas, parecendo que não conhece as suas dificuldades de mão-de-obra qualificada. Limitar por limitar, sem critérios objetivos e claros, pode prejudicar mais do que ajudar, em um país extremamente envelhecido.
PORTUGAL


A hipocrisia da nova lei de imigração portuguesa
Portugal é um país que se gaba por ser acolhedor, que vive do turismo e da imagem de “portas abertas”, decidiu em 2025, bater a porta na cara dos imigrantes.
A nova lei de imigração aprovada sob o governo de Luís Montenegro e ainda sob a presidência de Marcelo Rebelo de Sousa, sob os efusivos aplausos do partido de extrema-direita CHEGA!, foi feita não apenas para regulamentar, mas para dificultar e humilhar, pois simplesmente diz “não”, sem ter de justificar.
E tudo isto acontece, enquanto o país tem a segunda população mais envelhecida da Europa (média de 47 anos) e uma gigantesca falta de mão-de-obra em praticamente todos os setores, causada, sobretudo, devido a emigração de portugueses para outros países em busca de melhores salários.
Um labirinto feito para rejeitar
A legislação atual exige contrato de trabalho prévio, para quase todos os vistos de residência. Acabou-se a manifestação de interesse, que permitia regularização após entrada legal e contribuição para a Segurança Social.
O visto de procura de trabalho foi reduzido para 120 dias, renovável uma única vez, e só é concedido a quem provar qualificações em áreas consideradas “prioritárias”. Apenas se esqueceram de dizer quais são essas áreas e que as define. A transparência ficou de lado.
Não há lista pública objetiva, não há pontuação clara como no Canadá ou na Austrália, não há critérios mensuráveis de formação, experiência ou idioma. Há apenas a "discricionariedade" absoluta da AIMA e dos consulados, que é muito fácil descambar para a arbitrariedade. Nesses termos, um imigrante com mestrado, 10 anos de experiência e fluente em português, poderá ser recusado porque “não se enquadra no interesse nacional”. Trata-se de uma frase "mágica", que serve para tudo e não explica nada.
Isso não é regulação, mas uma sabotagem deliberada da imigração. É dizer àquelas pessoas qualificadas, sejam elas de onde forem, uma simples frase de: “aqui não precisamos de vocês”. Aliás, sendo mais direto: "aqui não é o Bangladesh", como disse André Ventura, presidente do CHEGA!.
O colapso previdenciário iminente
Estatisticamente, Portugal tem 183 idosos para cada 100 jovens – o segundo pior rácio da Europa, somente atrás da Itália. A taxa de natalidade é de 1,38 filhos por mulher, uma das mais baixas do mundo. Em 2024, morreram 130 mil portugueses e nasceram apenas 84 mil. A população economicamente ativa está a encolher a um ritmo assustador.
Faltam médicos, enfermeiros, pedreiros, agricultores, motoristas de Uber, empregados de mesa, cuidadores de idosos, entre outras atividades, mais ou menos qualificadas. As empresas se desesperam; a construção civil está quase parada por falta de mão-de-obra e os campos do Alentejo apodrecem, pois não há quem colha a azeitona ou a cortiça. Os lares de idosos fecham alas, porque não têm pessoal especializado.
E o que faz o governo? Fecha ainda mais a torneira, pois prefere pagar subsídios de desemprego a portugueses que não querem trabalhar na construção ou na agricultura, do que facilitar a entrada de imigrantes, que querem e precisam trabalhar. O governo de Luis Montenegro, na sua ânsia por manter-se no poder, ao que parece, quer ver o PIB cair e a segurança social colapsar, do que admitir que precisa da imigração. É o capitão afundar com o navio, cheio de orgulho patriótico.
Intransigência x inteligência
Assim, enquanto Portugal se fecha em copas, a Espanha - país vizinho - faz exatamente o oposto e com ótimos resultados.
Em novembro de 2024, o governo espanhol aprovou uma reforma profunda do Regulamento de Estrangeiros, que facilita a regularização por "arraigo laboral" (2 anos de residência + contrato), "arraigo social" (3 anos + contrato) e "arraigo familiar". Criou critérios claros e objetivos: tempo de residência comprovado, contrato de trabalho de pelo menos 20 horas semanais, ausência de antecedentes criminais. Assim temos, uma pontuação clara, prazos definidos e transparência total.
Dessa forma, milhares de imigrantes em situação irregular estão sendo legalizados em 2025. As empresas espanholas respiram, pois a economia cresce acima de 2,5% ao ano. A Segurança Social espanhola, recebeu um brutal aporte financeiro com as contribuições dos novos trabalhadores.
A Espanha percebeu que sem intransigência e com uma imigração bem regulada e objetiva, todos ganham. Portugal prefere a demagogia do “controle absoluto” à sua realidade económica e perde. Perde competitividade, perde crescimento, perde um futuro melhor para todos os seus cidadãos.
Xenofobia Institucionalizada
E quem mais aplaude toda esta loucura? O CHEGA!, um partido de extrama-direita, cujo presidente é fundador é o deputado André Ventura, que vem crescendo exponencialmente desde 2019.
André Ventura transformou a xenofobia em programa político e em negócio eleitoral. O outdoor “Isto aqui não é o Bangladesh”, colocado na campanha eleitoral de 2025 no Porto, foi apenas um dos muitos exemplos de pura xenofobia.
Gostaria que ficasse claro, que não sou partidário do "Bloco de esquerda" ou de grupos como "free Palestine". Minhas posições ideológicas são conservadoras e liberais, mas André Ventura extrapola e fala abertamente em coisas como “invasão islâmica”, “substituição étnica” e em “ciganos que vivem à custa do Estado”; a sua obsessão com a comunidade cigana é patológica e pública.
Em comícios, Ventura grita que “os ciganos não querem trabalhar” e que “os brasileiros trazem criminalidade”. Os outdoors do CHEGA!, comumente mostram famílias portuguesas sendo “ameaçadas”, por imigrantes de pele escura. É o mesmo discurso de Le Pen e de Orbán, agora institucionalizado no Parlamento português com 50 deputados eleitos.
O CHEGA! não quer resolver a imigração, mas usá-la como bode expiatório para o fracasso das políticas públicas portuguesas, como a alta da habitação, os salários baixos e serviços públicos degradados. É mais fácil culpar o “estrangeiro”, do que admitir que o problema é estrutural e "made in Portugal".
E o pior: para se manter no poder, o governo Montenegro faz concessões ao CHEGA!, pois a nova lei de imigração, tem o DNA da xenofobia escrito em cada artigo.
Chega de Hipocrisia
Não é mais possível ignorar, que Portugal precisa de 100 a 150 mil imigrantes por ano, apenas para manter a estabilidade da população economicamente ativa. Precisa de médicos, engenheiros, agricultores, cuidadores e enfermeiros de qualquer nacionalidade, mas, sobretudo, precisa de critérios objetivos, transparentes e generosos, como a Espanha estabeleceu. Por óbvio, não se quer banalizar a imigração; uma seleção cuidadosa e responsável se faz necessária, para evitar aventureiros e, sobretudo, a bandidagem.
Há de parar de ter medo da frase: “imigração necessária”. Não é possível admitir-se a xenofobia institucional do CHEGA!, que, inegavelmente, comunga pautas importantes para a sociedade portuguesa, porém, destila um perigoso veneno xenófobo, que não vai acabar com a "bandalheira", mas apenas aumentar o sofrimento dos portugueses, que estão médicos de família e esperando na fila para uma cirurgia ou para cuidados de seus idosos. Foram os imigrantes que ajudaram a construir a democracia norte-americana e que ajuda a manter a hegemonia econômica de vários Estados europeus, como a Alemanha e França.
Ter medo de que com a imigração venha a violência e a degradação social, é admitir a própria incompetência dos governantes, em manter o substrato social sob vigilância e controle, pois o monopólio da segurança pública é do Estado.
Se continuar no atual ritmo, ao chegar em 2050, Portugal terá pouco menos de 9 milhões de habitantes, uma segurança social falida ou à beira da falência e um país de idosos, que olharão para casas vazias com tijolos fechando portas e janelas, assim como para campos abandonados e tomados pelo capim.
A nova lei de imigração da forma como está sendo construída, não é apenas má política, mas um verdadeiro crime contra o futuro do país. CHEGA! desta vergonha. Portugal deverá abrir suas portas com inteligência e humanidade e nunca com arrogância e preconceito, caso contrário a médio prazo seu futuro estará comprometido de forma quase que irreversível.
A Espanha já abriu seus olhos para isso. O que falta para Portugal seguir o mesmo caminho?
