A radicalização nas eleições americanas

Trata-se de um problema mundial. A polarização política, que sempre coexistiu civilizadamente (exceções existem), está partindo para um posicionamento mais radical. Atualmente, você é conservador ou progressista, direita ou esquerda e o jogo de narrativas aumenta, criando um clima de revanchismo, que pode chegar à violência. O atentado a Donald J. Trump nos EUA, é o retrato do caminho que estamos a trilhar.

MUNDO

Manoel Oliveira

7/18/20246 min ler

O atentado contra o ex-presidente Donald Trump, candidato republicano à Casa Branca, ocorrido no sábado (13/7) durante um comício na Pensilvânia, abriu uma crise no Serviço Secreto dos Estados Unidos e demostra claramente ao mundo, o quão longe pode chegar a polarização e a radicalização do debate político.

Trump foi ferido levemente, um espectador foi morto e outros dois ficaram em estado grave, de acordo com um porta-voz do Serviço Secreto. Todas as vítimas são homens, mas suas identidades ainda não foram reveladas.

O Comitê de Supervisão, que é o principal órgão de investigação da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos (similar a nossa Câmara dos Deputados), convocou a diretora do Serviço Secreto, Kimberly Cheatle para depor, em uma audiência marcada para 22 de julho. “Os americanos exigem respostas sobre a tentativa de assassinato do presidente Trump”, afirmou o órgão em um comunicado nas redes sociais.

Em uma entrevista coletiva para a imprensa, sem a presença do Serviço Secreto, o agente especial do FBI, Kevin Rojek, disse ser “surpreendente”, que o atirador tenha conseguido abrir fogo contra o palco, antes do Serviço Secreto neutralizá-lo.

Contudo, quando questionado se houve falha na segurança, ele disse que “não iria fazer essa avaliação” com a investigação ainda em curso, que envolve o FBI, o Serviço Secreto e o Departamento de Segurança Interna (NSA).

Em uma publicação na rede Truth Social, Trump disse que uma bala perfurou a “parte superior” da sua orelha direita. “Eu soube imediatamente que algo estava errado, pois ouvi um zumbido, tiros e imediatamente senti a bala rasgando a pele”, escreveu Trump.

O conselheiro sênior da campanha de Trump, Stephen Moore, levantou dúvidas sobre o quanto o Serviço Secreto estaria, de fato, preparado. Ele classificou o episódio como um “dia assustador" e afirmou que estão todos em choque. “Recebi uma mensagem dizendo que Trump havia levado um tiro, e meu coração afundou. Tive medo de fazer a pergunta ‘ele vai ficar bem?’”, disse Moore.

"Parecia no vídeo que ele só tinha sido atingido de raspão, mas o que é tão assustador para todos nós é que, se a bala o tivesse atingido uma polegada a mais, em direção à sua cabeça, isso teria sido um assassinato." Moore acrescenta que "certamente Trump precisa de mais proteção" e disse que é necessária uma investigação "sobre se o Serviço Secreto estava totalmente preparado".

O FBI está liderando a investigação sobre o ocorrido, que terá no centro, a apuração da responsabilidade e eventuais falhas do Serviço Secreto, cuja função é proteger os presidentes e ex-presidentes dos Estados Unidos. Já faz 43 anos, desde a última tentativa de assassinato de um presidente dos Estados Unidos em exercício, quando Ronald Reagan foi baleado no pulmão, mas sobreviveu.

Os questionamentos agora giram em torno de como um rapaz de 20 anos, amador, foi capaz de rastejar até um ponto de observação no telhado, armado com um fuzil AR-15 e disparar quatro tiros em direção ao palco onde estava Trump, em uma área que deveria ter sido previamente inspecionada.

Anthony Guglielmi, porta-voz do Serviço Secreto, disse ser “falso” que um membro da equipe de Donald Trump, tenha solicitado “recursos” extras de segurança e que o pedido teria sido “rejeitado”. "Isso é absolutamente falso", disse Guglielmi. "Na verdade, adicionamos recursos, tecnologia e capacidades de proteção como parte do aumento do ritmo das viagens da campanha", reitera Guglielmi.

O jornalista britânico Tom Newton Dunn, que estava no local do tiroteio, descreveu o clima dos apoiadores como um "carnaval” antes do início do evento, acrescentando que Trump estava mais de uma hora atrasado, mas que “não se importaram nem um pouco com isso”.

Segundo Dunn, Trump tinha acabado de entrar no assunto da imigração ilegal, quando os tiros foram disparados e muitas pessoas não sabiam o que estava acontecendo naquele momento. A ideia de que algo mais grave estava ocorrendo, só surgiu quando foram ouvidos os gritos dos seguranças, para descer do palco.

"Algumas pessoas começaram a chorar. Uma senhora ao meu lado estava agachada no chão dizendo "Oh Jesus!, oh Jesus!, oh Jesus!, eles o pegaram'!", disse Dunn. "Outros reagiram com raiva. Alguns culpavam o público, os democratas, Joe Biden, culpando até mesmo a CNN e ficaram com raiva do Serviço Secreto."

O jornalista acrescentou que havia um outdoor digital fora do evento, que uma hora depois do tiroteio, exibia as frases: “Os democratas tentaram assassinar o presidente Trump!” e “Orando pelo presidente Trump!”.

O suspeito do atentado foi morto a tiros no local por atiradores do Serviço Secreto, disse o porta-voz da agência, Anthony Guglielmi. O agente especial Kevin Rojek, disse que Thomas Mathew Crooks, identificado como sendo o atirador, não levava documentos consigo e que foi utilizada análise de DNA para identificá-lo. Já se sabe, que ele era um membro da “Antifas” e deixou um vídeo dizendo que "a justiça estava chegando". Ainda não foram identificadas as razões ou o motivo da tentativa de assassinato.

“Antifas” é uma abreviação de "antifascistas" e se refere a um movimento político-ativista de ultraesquerda, composto por várias organizações autônomas e indivíduos, que compartilham um posicionamento comum contra o fascismo, ou formas de discurso de extrema-direita e discriminação. Eles são conhecidos por adotar táticas de ação direta, que podem incluir manifestações, contraprotestos e, em algumas ocasiões, métodos de confronto mais agressivos, para combater ideologias que consideram nocivas, o que inclui atentados à bala ou bomba.

Estamos realmente vivendo tempos difíceis, pois até a outrora maior democracia do mundo, está sucumbindo às radicalizações de dois grupos políticos dominantes. Ambos apresentam um elo comum, representado pela vontade de tomar o poder. As diferenças surgem na utilização de métodos para chegar ao poder e sua pretensão em perpetuar-se nele, seja ao preço que for.

No Brasil ainda estamos engatinhando nessa forma de radicalização. Nossa sociedade não tem por "hábito" matar presidentes, mas sim de retirá-los democraticamente do poder, através do instrumento constitucional conhecido por impeachment.

Após a eleição de 2018, o brasileiro começou a deixar a alienação política de lado e interessar-se mais na defesa das suas liberdades constitucionais, sobretudo, a de expressar as suas opiniões, o que contribuiu muito a eleição de Jair Messias Bolsonaro. Existe um divisor de águas para o brasileiro: antes e depois de Bolsonaro.

O patriotismo, que surgia apenas em época de Copa do Mundo ou Olimpíadas, passou a mobilizar o brasileiro, sobretudo, os mais conservadores (a maioria), que se autodenominaram de "patriotas", que passou a ser um substantivo, mais do que um simples adjetivo.

O sentimento de amor à pátria ficou ainda mais exacerbado e radicalizado, quando as eleições de 2022, trouxeram de volta à cena política, Luiz Inácio Lula da Silva, preso e condenado em todas as instâncias judiciais a 12 anos de prisão, por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha, da qual era apontado como o "chefe". Lula que estava impedido de concorrer, pois era "ficha suja" (condenado), a teve limpa pelo Supremo Tribunal Federal, que, contrariando sua jurisprudência e decisões anteriores, anulou todas as suas condenações, tornando apta a sua candidatura.

Já o ex-presidente Jair Bolsonaro, foi tornado inelegível por 8 anos pelo TSE, presidido pelo Ministro Alexandre de Moraes. Todos aqueles que participaram da "operação java-jato", que cunhou o "mensalão" e o "petrolão" de Lula, como sendo os dois maiores crimes de corrupção do mundo. Sergio Moro, o Juiz da lava-jato de Curitiba (a principal sede), foi eleito senador; Deltan Dallagnol, o procurador que elaborou a denúncia criminal, foi eleito deputado federal. Os dois estiveram na mira do TSE, para serem cassados, porém, somente Deltan o foi. Moro, surpreendentemente, acabou cedendo ao sistema e foi poupado.

Nem iremos adentrar na eleição de Lula, que está sob suspeição, pois ele é - literalmente - um presidente "sem povo". A qualquer capital ou município brasileiro que vá, Lula é xingado e vaiado copiosamente, podendo apenas comparecer em eventos controlados, que na maioria das vezes, revela-se um fiasco. Isso tudo tendo, supostamente, 60 milhões de votos.

Todos esses fatos, somados a um governo Lula politicamente fraco e economicamente falido e repleto de escândalos de corrupção, está acirrando os ânimos cada vez mais, tornando a polarização e a dicotomia, um atalho para a radicalização, como ocorreu no dia 08/01/2023, quando uma turba de milhares de fanáticos, inconformados com a eleição de Lula, inflados por bandidos e arruaceiros, invadiram as sedes dos três poderes, quebrando tudo por onde passava.

Com a participação do TSE e STF, que se aliaram ao governo, o Brasil passou rapidamente a um estado de censura, sem qualquer liberdade para exprimir-se, sobretudo, pelas redes sociais, que foram marcadas como alvo primário dos censores judiciais. Muitos jornalistas foram perseguidos, tendo seus perfis nas redes sociais excluídos ou censurados, suas contas bancárias e bens congelados, sendo obrigados a pedir asilo nos EUA.

Espera-se, sinceramente, que o povo brasileiro opte por conseguir manter suas liberdades constitucionais, pela via democrática. Violência nada resolve, somente condena.